Flavio Serafini

Reajuste de 30% na merenda das escolas, já!

No início do ano letivo de 2022, marcado pela retomada integral dos estudantes na rede estadual de ensino, vivenciamos desafios adicionais para a garantia do fornecimento de alimentação escolar de qualidade e em acordo com a legislação. A inflação, o aumento dos preços dos alimentos, o aumento da demanda por alimentação escolar registrado por todos os diretores de escolas visitadas e a necessidade de garantir o disposto no cardápio sugerido pela Secretaria Estadual de Educação (Seeduc) colocou esse tema no centro do debate educacional no Rio de Janeiro.

Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)

A alimentação escolar se insere no âmbito da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), uma vez que um dos princípios do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é a garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada. O PNAE oferece alimentação escolar e ações de educação alimentar e nutricional a estudantes de todas as etapas da educação básica pública.

O PNAE foi criado há pouco mais de 55 anos e tem, no conjunto das políticas sociais brasileiras, como objetivos específicos a incorporação de hábitos alimentares saudáveis e condições nutricionais adequadas aos estudantes. O programa é viabilizado com recurso federal, repassado mensalmente pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) aos estados, municípios e Distrito Federal. Em tese, aos estados, o recurso federal destina-se ao atendimento da rede estadual de ensino, e, aos municípios, ao atendimento da rede municipal e filantrópica. A escola, por sua vez, apresenta-se como espaço ideal para essa prática, no intuito de promover valores que respeitem a diversidade cultural, o meio ambiente, os aspectos sociais e econômicos.

São atendidos pelo programa, os alunos de toda a educação básica (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos) matriculados em escolas públicas, filantrópicas e em entidades comunitárias (conveniadas com o poder público). O governo federal repassa a estados, municípios e escolas federais, valores financeiros de caráter suplementar. Vale destacar que o orçamento do PNAE beneficia milhões de estudantes brasileiros, como prevê o artigo 208º, incisos IV e VII, da Constituição Federal 1988 que determina, como dever do Estado, garantir por meio de programas suplementares à educação, a alimentação para os estudantes.

O gerenciamento do PNAE mostra-se complexo em virtude de estarem diretamente envolvidos no processo: União, estados, municípios, Conselhos de Alimentação Escolar e estabelecimentos de ensino, bem como pela existência de características regionais e diversidade na clientela, na infraestrutura e nos hábitos alimentares. O PNAE é acompanhado e fiscalizado diretamente pela sociedade, por meio dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE), e também pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), pelo Tribunal de Contas da União (TCU), pela Controladoria Geral da União (CGU) e pelo Ministério Público (MP).

Segurança Alimentar e Nutricional (SAN)

A Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) propõe que as políticas de estímulo ao crescimento da produção agroalimentar devam estar associadas à valorização das culturas alimentares, bem como ao enfrentamento da pobreza no meio rural e ao estímulo ao desenvolvimento local e regional. Nessa perspectiva, a Resolução nº 26/2013 estabelece que as entidades executoras (secretarias estaduais de educação, as prefeituras municipais e também as escolas federais) comprem 30% dos gêneros alimentícios oriundos da agricultura familiar, objetivando fortalecer e incentivar sua produção, e do empreendedor familiar rural com dispensa de licitação. Visa ainda, entre outros pontos observados nas diretrizes do programa, favorecer uma diversidade de produtos na alimentação escolar e estimular o consumo de alimentos da região.

O Brasil apresenta significativo percentual de municípios pequenos. Se por um lado a proximidade contribui para proporcionar maior transparência às ações governamentais, por outro interfere no uso clientelista de recursos públicos, historicamente associados à natureza das relações entre burocracias públicas e alguns personagens da velha política. Outras dificuldades na implantação da descentralização para o aparelho social do Estado são: burocracia excessiva; bloqueio à formulação e implantação de planos gerais para cada setor da política social nacional; ausência de mecanismos públicos de controle e superposição de programas e clientelas.

Alimentação saudável e agroecológica

Segundo o site do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), a Lei nº 11.947, de 16 de junho de 2009 determina que no mínimo 30% do valor repassado a estados, municípios e Distrito Federal pelo FNDE para o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) deve ser utilizado na compra de gêneros alimentícios diretamente da agricultura familiar e do empreendedor familiar rural ou de suas organizações, priorizando-se os assentamentos da reforma agrária, as comunidades tradicionais indígenas e as comunidades quilombolas. Também se dá preferência a produtos orgânicos e/ou agroecológicos.

Embora se reconheça a importância social, ambiental, cultural e também econômica da agricultura familiar, ainda são manifestadas as dificuldades vivenciadas pelos produtores, tais como: difícil acesso à assistência técnica e extensão rural, falta de mão de obra, de canais de comercialização e tecnologias para produção. Nesse sentido, o apoio aos agricultores familiares, de modo a incentivar a produção de alimentos sustentáveis, é fundamental. Tanto pela possibilidade de melhorar a qualidade e a diversidade de produtos na alimentação escolar, como pela capacidade de incremento de renda e ocupação aos agricultores familiares, através do fornecimento de alimentos frescos e/ou com processamento mínimo, sazonais e com menor teor de agroquímicos, ou isentos desses, no caso dos orgânicos/agroecológicos.

Entre outros desafios citados do programa estão a dificuldade de organização dos agricultores para atender a nova demanda, o despreparo dos mesmos para lidar com questões burocráticas, a falta de capacitação dos agricultores para atender às exigências sanitárias e de regularidade de fornecimento, bem com a dificuldade de logística dos produtos, ou seja, casos em que nem os agricultores conseguem realizar as entregas e nem tampouco o município ou estado possui um centro para recebimento dos produtos. As dificuldades se concentram, portanto, na falta de ação do estado para viabilizar a execução da lei federal. Além disso, cita-se gargalos no que se refere à adaptação das merendeiras e das escolas que passaram a não receber mais produtos industrializados e prontos para o consumo e a necessidade de controle social a partir da concretização do Conselho de Alimentação Escolar.

Na visão de vários pesquisadores do assunto, para superar as dificuldades de gestão e êxito do PNAE, o caminho mais adequado talvez seja o de integrar distintos setores e atores das mais diversas áreas do conhecimento. Também é necessário implementar estratégias de setores públicos e da sociedade civil organizada para a concretização da compra da agricultura familiar para a alimentação escolar. Lembrando que a agricultura familiar opõe-se ao absenteísmo praticado pela agricultura latifundiária, que esvazia e depreda o meio rural.

A luta por mais recursos para as merendas escolares

Conjunturalmente, em decorrência da pandemia que promoveu uma crise sanitária e humanitária que levou famílias ao quadro de vulnerabilidade social e econômica, afirmamos a necessidade do papel do Estado em garantir o acesso a uma alimentação e nutrição dignas. É necessário que o legislativo, executivo, a comunidade escolar incorpore o entendimento que o espaço escolar também cumpre papel de educação nutricional, construindo a identidade cultural e  alimentar daquele território.

Em um Brasil que retornou para o mapa da fome, onde a população briga na fila do osso e que apenas 26% das crianças fazem três refeições por dia, queremos garantir o fornecimento de alimentação de qualidade nos colégios estaduais – o que vem sendo missão quase impossível para as direções escolares. Nosso mandato apresentou esta semana o Projeto de Lei 5764/2022 para reajustar em 30% o repasse para a aquisição da merenda. Queremos que a alimentação de nossas crianças siga critérios para garantir a segurança alimentar e nutricional.

Em recente audiência pública que nosso mandato organizou, a Seeduc se comprometeu com um reajuste de 10% no valor repassado para a compra desses alimentos, mas ainda é pouco e não aconteceu. O reajuste de 30% que propomos visa garantir a qualidade e a quantidade adequada. A alimentação escolar digna é parte fundamental da luta para a garantia do direito à educação. Com fome ninguém estuda direito. Reajuste na merenda, já!

Assine o abaixo-assinado para apoiar a luta por reajuste de 30% no valor da merenda nas escolas do Rio de Janeiro!

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